O ministro Mauro Campbell Marques, corregedor nacional de Justiça, revelou nesta terça-feira (5) que o desembargador afastado João Ferreira Filho, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), adquiriu imóveis de alto padrão avaliados em mais de R$ 5,1 milhões, mas declarou à Receita Federal ter pago apenas R$ 123 mil por eles.
A declaração foi feita durante a sessão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que manteve o afastamento do magistrado e aprovou a abertura de um processo administrativo disciplinar (PAD).
Ferreira Filho é suspeito de integrar um esquema de venda de sentenças judiciais, investigação que ganhou força após a análise de mensagens extraídas do celular do advogado Roberto Zampieri, assassinado em 2023, em Cuiabá.
A relação entre o magistrado e o advogado, segundo o CNJ, envolvia benefícios pessoais, como presentes de alto valor e intermediações ilegais em decisões judiciais.
O ministro Campbell detalhou que o desembargador adquiriu, de uma única vez, dois apartamentos da incorporadora Vanguard, declarando ter pago apenas R$ 21,5 mil por unidade, enquanto os valores reais seriam de R$ 472 mil e R$ 434 mil.
Em seguida, comprou uma terceira unidade no mesmo empreendimento, novamente declarada pelo mesmo valor subfaturado, embora o pagamento real tenha sido de R$ 592 mil, segundo informações da empresa.
A investigação ainda revelou a aquisição de outro imóvel, desta vez da construtora Plaenge, também com valor incompatível com o declarado.
O magistrado informou ter pago R$ 59 mil por uma unidade do edifício Apogeu, que atualmente tem imóveis anunciados por cerca de R$ 3,7 milhões.
O cruzamento de dados bancários indica que apenas R$ 131 mil das compras teriam sido pagos diretamente por João Ferreira Filho. O restante foi quitado, segundo o corregedor, por terceiros ligados a ele, entre eles a esposa, Maria de Lurdes Ferreira, e a filha, Alice Artuso.
Alice, inclusive, teria recebido mais de R$ 1 milhão de uma empresa cujo sócio é o próprio advogado Zampieri, e teria usado esse dinheiro para quitar boletos em nome do pai, somando pelo menos R$ 910 mil.
As suspeitas se estendem a faturas de cartão de crédito e até à compra de motocicletas. Em 2023, o magistrado teria desembolsado mais de R$ 1,3 milhão apenas com o cartão, superando em R$ 300 mil os seus rendimentos anuais como desembargador.
Segundo Campbell, a fatura média mensal passou de R$ 41 mil para R$ 113 mil.
A relação entre Ferreira e Zampieri envolvia ainda o recebimento de itens de luxo, como um relógio da marca Patek Philippe, avaliado em cerca de R$ 500 mil. O advogado também teria atuado em processos sem procuração, intermediando decisões que, segundo a investigação, teriam sido compradas.
"O conjunto probatório aponta a possível prática reiterada de condutas que violam a ética, a legalidade e os deveres funcionais da Magistratura, com indícios robustos de favorecimento pessoal e ocultação de patrimônio", concluiu o ministro Campbell.
O PAD agora seguirá trâmite no CNJ, enquanto o magistrado permanece afastado das funções.