Apesar dos avanços legais conquistados nos últimos anos, a realidade enfrentada por milhões de trabalhadoras domésticas no Brasil ainda é marcada por informalidade, baixos salários e violações de direitos básicos. A avaliação é da auditora fiscal do trabalho Carla Galvão de Souza, coordenadora Nacional de Fiscalização do Trabalho Doméstico e de Cuidados, da Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE).
Carla participou, na quarta-feira (23), do lançamento da Campanha Nacional pelo Trabalho Doméstico Decente, realizado no Recife, às vésperas do Dia da Trabalhadora Doméstica, comemorado em 27 de abril. A iniciativa, permanente, visa conscientizar a sociedade, ampliar a fiscalização e promover o respeito à legislação trabalhista da categoria.
Durante fiscalizações ao longo do ano, auditores do trabalho distribuem materiais informativos como cartazes para condomínios e cartilhas direcionadas a empregadores e trabalhadoras. O objetivo é reforçar os direitos garantidos pela Lei Complementar 150 e pela Constituição Federal.
“Ainda há direitos que não são iguais aos de outras categorias”, ressaltou Carla. Um exemplo é o seguro-desemprego, que para trabalhadoras domésticas é limitado a três parcelas, enquanto os demais trabalhadores recebem até cinco. A auditora também destacou a persistência de remunerações abaixo do salário mínimo — uma realidade confirmada pela última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad).
Em 2022, o rendimento médio das trabalhadoras domésticas foi de R$ 1.018, inferior ao salário mínimo da época (R$ 1.212). A desigualdade racial é evidente: enquanto mulheres brancas receberam, em média, R$ 1.145, as negras ficaram com R$ 955.
Outro problema frequente é a ausência de controle sobre a jornada de trabalho, especialmente em casos de trabalhadoras que dormem no local de trabalho, sem limite claro de expediente. Isso compromete direitos como pagamento de horas extras, adicional noturno e descanso em feriados.
A pandemia da Covid-19 agravou a informalidade no setor, que hoje atinge cerca de 60% da categoria, segundo o MTE. “Temos 5,8 milhões de trabalhadores domésticos no Brasil. Desses, 90% são mulheres, majoritariamente pretas ou pardas, entre 40 e 60 anos”, apontou Carla.
Ela critica a visão ainda presente entre empregadores de que o trabalho doméstico seria uma espécie de servidão moderna. “Há uma falta de valorização e reconhecimento da profissionalização exigida. É como se esse saber pudesse ser descartado a qualquer momento.”
A campanha nacional busca, justamente, romper com esse imaginário, pressionar por mais registros formais no eSocial, garantir direitos como o 13º salário e férias remuneradas, e consolidar uma cultura de dignidade e respeito no trabalho doméstico.