Pela primeira vez, o Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA) reconheceu judicialmente um caso de multiparentalidade e determinou a alteração no registro de nascimento para incluir simultaneamente dois pais e duas mães — biológicos e afetivos — em um único registro civil. A decisão inédita foi proferida pelo juiz Antônio Manoel Araújo Velôzo, da 3ª Vara Cível de Caxias.
A multiparentalidade, no campo jurídico, consiste no reconhecimento legal de mais de um vínculo parental para uma mesma pessoa, permitindo que alguém tenha, formalmente, mais de um pai e/ou mãe, sejam eles biológicos ou socioafetivos.
Segundo o processo, o homem identificado pelas iniciais M. C. S. F. foi originalmente registrado como filho do casal M. C. S. e S. B. F. S. Porém, anos depois, os pais biológicos — S. L. S. e M. N. C. —, junto ao próprio filho, solicitaram judicialmente o reconhecimento da parentalidade biológica, sem que isso implicasse a exclusão dos pais registrais e afetivos.
A Defensoria Pública do Estado acompanhou o caso e confirmou que o pedido partiu da manifestação livre e espontânea de todas as partes. Os pais registrais também compareceram ao órgão e consentiram com a inclusão dos vínculos biológicos. O Ministério Público deu parecer favorável à demanda.
Na sentença, o juiz Antônio Velôzo explicou que o caso não poderia ser resolvido em cartório, já que envolve matéria de repercussão geral, conforme entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
“Deixou-se de apresentar a demanda diretamente em serventia extrajudicial por ultrapassar matéria de natureza ordinária e corriqueira, exigindo a intervenção do Poder Judiciário para colher manifestação de vontade das partes requeridas, diante de tema de Repercussão Geral do Supremo Tribunal Federal”, pontuou.
A decisão se baseou no Tema 622 de Repercussão Geral do STF, que reconhece a validade da multiparentalidade e a possibilidade de coexistência entre vínculos biológicos e socioafetivos, sem hierarquia entre eles. Esse entendimento, consolidado no julgamento do Recurso Extraordinário (RE 898060/SC), determina que ambos os vínculos podem produzir efeitos jurídicos distintos, respeitando os laços afetivos e biológicos em suas especificidades.
Com a decisão, o registro de nascimento do homem será alterado para constar os nomes dos quatro pais e mães, garantindo a ele todos os direitos decorrentes dessa multiparentalidade reconhecida.