O presidente do Tribunal de Contas de Mato Grosso (TCE-MT), conselheiro Sérgio Ricardo, revelou que diversas prefeituras do estado estão desperdiçando bilhões de reais em recursos para prevenção de desastres naturais por falta de planejamento e estrutura técnica. O alerta foi feito nesta quarta-feira (14), na abertura da capacitação “Proteção e Defesa Civil - Plano de Contingência”, promovida pelo TCE-MT. Segundo o presidente, 81% dos municípios não adotam medidas eficazes para evitar tragédias ambientais.
“Vejam só os recursos que existem: o Fundo Nacional sobre Mudança do Clima tem R$ 11 bilhões, o PAC, quase R$ 15 bilhões, o BRDE, R$ 1,7 bilhão e o BID, quase US$ 8 bilhões. Muitas vezes, a principal causa de não acessar é a falta de informação. Os municípios não utilizam porque não conseguem chegar no dinheiro. Tem que estar preparado documentalmente para acessar esses valores, senão os recursos ficam disponíveis, mas fora do alcance”, declarou Sérgio Ricardo.
Realizado em parceria com o Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) e a Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM), o encontro busca, justamente, auxiliar gestores na estruturação de planos de contingência e no acesso a recursos disponíveis para a prevenção de desastres. “Estamos oferecendo as ferramentas para que cada prefeitura esteja pronta para proteger vidas e buscar os investimentos que já existem”, acrescentou o conselheiro-presidente.
Para o presidente do TJMT, desembargador José Zuquin Nogueira, a qualificação vai fortalecer a resposta dos municípios diante desses desafios. “A boa governança não se limita a rotinas administrativas, mas exige a capacidade de antecipar riscos e planejar soluções duradouras. A agilidade e a precisão da ação salvam vidas, protegem patrimônios e evitam perdas irreparáveis.”
Já o presidente da AMM, Leonardo Bortolin, ressaltou que o tema não pode ser tratado isoladamente pelos gestores municipais. “Esse é um tema que é impossível o município desenvolver sozinho. Este é um pontapé importante para que, neste elo entre instituições, possamos concentrar esforços para levar conhecimento aos municípios: como acessar recursos, como ter um plano bem elaborado”, afirmou.
O comandante-geral do Corpo de Bombeiros Militar de Mato Grosso, coronel Flávio Glêdson Vieira Bezerra, destacou que a prevenção exige planejamento contínuo e investimentos robustos. “No ciclo de prevenção e preparação, nós temos diversas ações realizadas pelo Governo do Estado. Só em 2025, estão previstos R$ 125 milhões de investimento para esse enfrentamento. Não há nenhum estado que invista isso para enfrentar essa problemática”, pontuou.
A defensora pública-geral, Maria Luziane Ribeiro de Castro, destacou que a justiça social deve estar no centro das ações de prevenção, com foco na população vulnerável. “É fundamental garantir que todos, inclusive os mais vulneráveis, tenham acesso e proteção à reconstrução. A Defensoria Pública se coloca à disposição ao lado de todas as instituições para debater essa importante temática para o nosso estado e para o nosso país”, disse.
A deputada federal Gisela Simona, por sua vez, defendeu a estruturação das defesas civis municipais e criticou a ausência de profissionais capacitados em muitas cidades. Segundo ela, essa carência prejudica a resposta a desastres e o acesso a recursos federais. “Muitas vezes nós não temos um corpo técnico que acompanha essa pessoa que está na gestão, para que, em momentos de crise, possa efetivamente fazer esse trabalho técnico. Precisamos sim de pessoas que estejam permanentemente capacitadas para isso”, pontuou.
Nesse sentido, o procurador-geral do Ministério Público de Contas (MPC-MT), Alisson Carvalho de Alencar, destacou que investir em defesa civil é uma forma concreta de salvar vidas e reduzir os danos causados por eventos climáticos extremos. “Utilizar recursos, tempo, para reduzir os potenciais das emergências climáticas significa salvar vidas. Por isso, são tão importantes a atuação conjunta e o foco em criar um plano muito concreto, de longo prazo, de contingência dos eventos climáticos danosos e catastróficos”, afirmou.
Nota recomendatória aponta fragilidade das prefeituras
De acordo com o presidente do TCE-MT, apenas seis municípios mato-grossenses possuem alta capacidade de resposta a desastres naturais. Os dados fazem parte de levantamento realizado pela Comissão Permanente de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Tribunal, que também identificou que 13 prefeituras sequer estão cadastradas no Sistema Integrado de Informações sobre Desastres. Além disso, 40 cidades foram classificadas com perfil de risco elevado, sendo que 11 delas concentram mais de 6 mil pessoas em áreas sujeitas a deslizamentos, enxurradas e inundações.
Ainda segundo o levantamento da Comissão, que também é liderada por Sérgio Ricardo, além do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima, que concentra a maior parte dos recursos nacionais para ações climáticas, gestores também podem acessar linhas de financiamento do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE) e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Esses recursos somam valores expressivos destinados à prevenção de desastres e à adaptação climática, contemplando desde obras de resiliência urbana até projetos de mobilidade sustentável, transição energética e recuperação ambiental.
Diante disso, o TCE-MT recomendou a adoção de uma série de medidas. “Segundo os levantamentos nossos, apenas seis municípios mato-grossenses possuem alta capacidade de resposta a desastres. Enquanto isso, 81% carecem de medidas eficazes e 13 municípios sequer se cadastraram junto ao Ministério da Integração. Já vou dizer o que isso significa: perder muito dinheiro”, ressaltou o presidente.
Contextualização, legislações e políticas públicas
A primeira palestra da capacitação foi ministrada pelo secretário Nacional de Proteção e Defesa Civil, Wolnei Wolff, que fez uma contextualização, apresentou legislações e abordou políticas públicas de Defesa Civil. Na ocasião, o secretário ratificou os dados apresentados pelo presidente do Tribunal de Contas.
“Se investíssemos mais em prevenção, gastaríamos menos em gestão de desastres. O presidente está certo, recebemos pouquíssimas solicitação de recursos para enfrentar os desafios causados pelas fortes chuvas que caíram em Mato Grosso, por exemplo”, pontuou. A mais relevante foi de Paranatinga, que está de parabéns, pois apresentou um plano de reconstrução em que apontou a destruição de 11 pontes, o qual já aprovamos e estamos empenhando R$ 7,2 milhões para o município”, salientou Wolff.
Nesse sentido, o secretário destacou ser fundamental, dentre outros fatores, a restruturação/estruturação dos órgãos de proteção e defesa civil em todas as esferas, bem como a criação de uma carreira específica para atuação nesses órgãos, visando assegurar a continuidade das ações de redução de riscos de desastres.
“A imensa vulnerabilidade social, combinada com as mudanças do clima, criam um cenário extremamente preocupante e os órgãos de proteção e defesa civil necessitam estar estruturados para fazer frente a esse novo cenário, vide o que aconteceu no Rio Grande do Sul em 2024”, completou.
Capacitação segue até sexta-feira
Com duração de três dias, a capacitação é realizada no auditório da Escola Superior de Contas e transmitida ao vivo pelo Canal do TCE no YouTube e pela TV Contas (Canal 30.2). São mais de 40 palestrantes e mediadores das mais diversas áreas reunidos para discutir a atuação de gestores municipais frente aos riscos climáticos, ambientais e sociais de eventos climáticos extremos. O objetivo é orientar os gestores municipais na elaboração ou atualização de seus Planos de Contingência (PLANCON), conforme as diretrizes da Política Nacional de Proteção e Defesa Civil.
Também compuseram o dispositivo de honra na solenidade de abertura o supervisor da Escola Superior de Contas, conselheiro Waldir Teis, o conselheiro Valter Albano, a presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Mato Grosso (OAB-MT), Gisela Cardoso, a promotora de Justiça Michele de Miranda Rezende Villela, o secretário do Tribunal de Contas da União em MT, René de Oliveira Júnior, o presidente da União das Câmaras Municipais de Mato Grosso, Bruno Rios, a pesquisadora do Programa de Pós-graduação em Física Ambiental da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) Iramaia Jorge Cabral de Paulo e o pesquisador da Universidade Federal de Rondonópolis (UFR), Thiago Fernandes.