No coração das selvas densas do Araguaia, onde o verde engole trilhas e silencia passos, um dos maiores mistérios do século XX completa cem anos neste mês de maio: o desaparecimento do coronel britânico Percy Harrison Fawcett, figura que se entrelaça à história, lenda e misticismo do interior de Mato Grosso.
O explorador sumiu em 1925 durante sua busca incansável pela mítica Cidade Z, uma civilização que acreditava estar escondida nas profundezas do Xingu.
Fawcett, geógrafo, cartógrafo e veterano de guerra, havia se tornado um nome de prestígio na Sociedade Geográfica Real da Inglaterra.
As suas histórias sobre cidades perdidas, inspiradas em relatos de bandeirantes, manuscritos antigos como o Documento 512 e até em artefatos enigmáticos, como um totem de basalto, cativaram o público europeu e lhe garantiram recursos para suas viagens ao desconhecido.
A última vez que se ouviu falar dele foi numa carta enviada à família em 29 de maio de 1925. Desde então, nenhum rastro foi encontrado.
Teorias se multiplicaram: teria sido morto por indígenas Kalapalo? Morrido de fome sem jamais ser localizado? Ou encontrado a Cidade Z, desaparecendo voluntariamente num mundo oculto, como acreditam alguns?
Mesmo sem provas materiais de sua existência ou morte, o mito cresceu. Supostas ossadas foram descartadas, rumores sobre descendentes albinos foram desmentidos, e novas histórias, como a de uma cidade secreta chamada Ratanabá, continuam a surgir, mantendo o fascínio vivo.
O historiador Suelme Fernandes, do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso, acredita que a explicação mais plausível é a da inanição.
Fawcett, acompanhado apenas do filho Jack e de um amigo, partiu de Cuiabá com suprimentos limitados e recusou qualquer apoio, inclusive do marechal Rondon, que alertara para os perigos da empreitada.
O desaparecimento provocou uma onda de expedições internacionais em busca de respostas. Muitas acabaram em tragédia, mas também contribuíram para o avanço no mapeamento da região, como a carta geográfica lançada por Rondon em 1952.
Cem anos depois, o corpo de Fawcett continua perdido, mas seu nome permanece gravado na memória de Mato Grosso. A Cidade Z talvez nunca tenha existido, mas a lenda sobrevive, alimentando sonhos de riqueza, aventura e do extraordinário.
Como destaca Suelme, é da natureza humana sonhar com terras encantadas. E é esse sonho, mais do que qualquer ruína, que ainda pulsa na floresta.