A apresentação do trio de hip-hop irlandês Kneecap no festival Coachella 2025 entrou para a história pelos motivos errados. Na noite de sexta-feira, 18 de abril de 2025, durante o segundo fim de semana do festival, o grupo subiu ao palco Sonora tradicionalmente dedicado a artistas insurgentes e alternativos e transformou seu show em um verdadeiro protesto político. Logo no início da performance, enormes letreiros luminosos exibiram frases inflamadas: “Israel está cometendo genocídio contra o povo palestino” e, em seguida, “F** Israel, Free Palestine”* (em tradução livre, “F*** Israel, Palestina Livre”) . A mensagem continuou com a acusação de que os Estados Unidos estariam financiando os “crimes de guerra” de Israel . Diante de milhares de espectadores atônitos, o vocalista Mo Chara assumiu o microfone para contextualizar o protesto: “Há não muito tempo, nós, irlandeses, fomos perseguidos pelos britânicos, mas nunca fomos bombardeados do céu sem ter para onde ir”, bradou, traçando um paralelo entre a história da Irlanda e a situação dos palestinos. “Os palestinos não têm para onde ir é a casa deles e estão sendo bombardeados do céu” . Em seguida, Mo Chara provocou o público americano: “Se você não chama isso de genocídio, vai chamar de quê?”, incitando a plateia a entoar um coro de “Free, free Palestine” .
O teor incendiário do show rapidamente se espalhou para fora dos limites do deserto de Indio. Apesar de as apresentações do palco Sonora não terem transmissão ao vivo oficial naquele fim de semana, o Kneecap trouxe o streamer Hasan Piker para transmitir partes do ato via Twitch , garantindo que as polêmicas frases alcançassem a internet em tempo real. Em questão de horas, vídeos e fotos do telão com “F** Israel, Free Palestine”* circulavam nas redes, e a hashtag do Coachella ganhava contornos de debate geopolítico. O que era para ser apenas mais um show experimental de rap se tornou um furacão de controvérsia, escancarando tensões latentes no público do festival e muito além dele.
Quem é Kneecap? Rebeldia irlandesa e ativismo radical
Para entender a ousadia do Kneecap, é preciso conhecer suas raízes. O trio, formado em Belfast, Irlanda do Norte, ganhou notoriedade por misturar rap em língua irlandesa com mensagens políticas ácidas. Autointitulados “republican hoods” (bandidos republicanos), os músicos DJ Próvaí, Mo Chara e Móglaí Bap trazem no próprio nome uma provocação – “kneecap” refere-se a um método violento de punição atribuído a paramilitares irlandeses. Desde o início da carreira, o grupo abraça a ideologia do republicanismo irlandês, defendendo abertamente a reunificação da Irlanda e criticando a dominação britânica em sua terra natal . Suas letras e entrevistas frequentemente atacam figuras e instituições ligadas ao establishment britânico, como a polícia da Irlanda do Norte (PSNI) e políticos unionistas, e não poupam linguagem: sarcasmo, deboche e palavrões fazem parte de seu arsenal cultural.
O Kneecap já publicou fotos de membros lendo um livro de citações do líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah , e não hesita em demonizar Israel em declarações públicas.
Em posts online, chegaram a vociferar “FUCK US-BACKED ISRAEL” (com a palavra não censurada) em repúdio a ações militares israelenses . Ou seja, a postura exibida no Coachella não surgiu ali de forma oportunista faz parte de um histórico consistente (e controverso) de ativismo político do grupo.
Indignação imediata: do público às redes e à organização do festival
As consequências do ato do Kneecap foram tão estrondosas quanto as mensagens projetadas. No gramado do Coachella, parte do público se dividiu entre aplausos à coragem política da banda e expressões de choque ou desconforto. Alguns espectadores, pegos de surpresa em meio a um festival de música, relataram sentir o ambiente ficar “pesado” e tenso. “Nunca vi algo assim em um show, foi impactante e perturbador”, comentou um fã nas redes. Em questão de minutos, vídeos amadores inundaram o Twitter (X) e o Instagram, atraindo comentários inflamados. Nas mídias sociais, muitos usuários judeus e aliados de Israel expressaram repúdio absoluto ao que viram como um abuso da plataforma cultural do festival. “Usar um festival de música para celebrar terroristas que massacram milhares em um festival… Eu queria que isso fosse piada”, escreveu um internauta no X, referindo-se ao massacre ocorrido no festival Nova, em Israel, poucos meses antes . Outro apontou a hipocrisia que enxergou na cena: “É o cúmulo da hipocrisia: gritos de ‘Free Palestine’ em Coachella por jovens liberais fantasiados, ostentando liberdades que os levariam à morte se estivessem na Palestina.
Paralelamente, a organização do Coachella foi colocada contra a parede. Assim que as notícias correram, Goldenvoice, a empresa promotora do festival, passou a ser alvo de críticas de grupos judeus e pró-Israel, cobrando explicações de como esse incidente pôde acontecer em um dos palcos do evento . No sábado, surgiram reportagens alegando que Paul Tollett, cofundador e CEO do Coachella, teria ficado “surpreendido” e “chocado” com as mensagens anti-Israel exibidas pela banda . De acordo com uma matéria publicada pelo Hollywood Reporter, Tollett e sua equipe teriam sido “pegos de surpresa” pelo teor vulgar e incendiário do protesto, indicando que não houve aprovação prévia daquele conteúdo . Afinal, na escalação oficial, Kneecap era apenas mais um nome alternativo do lineup e não um potencial catalisador de crise diplomática.
A organização do Coachella, por sua vez, limitou-se a afirmar que desconhecia as intenções políticas da banda na contratação e fontes internas admitiram que, após ver o que ocorreu no primeiro fim de semana, permitir a segunda apresentação sem restrições foi um erro de avaliação .
Sharon Osbourne, empresária e personalidade da indústria musical, foi uma das vozes mais estridentes nesse coro. Em uma postagem no Instagram que rapidamente se espalhou, Sharon que é filha de pai judeu e mãe irlandesa acusou o festival de ter “comprometido sua integridade moral e espiritual” naquele ano . Para ela, permitir que o Coachella se tornasse palco de discursos de ódio foi uma falha gravíssima da direção. “Goldenvoice, a organizadora, facilitou isso ao deixar artistas usarem o palco como plataforma política”, escreveu ela, lembrando que música deveria servir para unir, não para semear o ódio . Osbourne destacou que o local “não é lugar para promover organizações terroristas nem espalhar ódio” uma referência clara ao conteúdo pró-Palestina extremo do Kneecap, que na visão de muitos equivaleu a apoiar grupos extremistas como o Hamas.
A indignação de Sharon Osbourne não parou aí. Ela cobrou a agência de empresários que representa o Kneecap (a Independent Artists Group, que curiosamente tem agentes de origem judaica em seu quadro) por não ter vetado ou moderado as ações da banda . E, num apelo contundente, chegou a pedir publicamente a revogação dos vistos de trabalho do trio nos Estados Unidos . “Essa banda deixou claro que apoia organizações terroristas. Mostrar esse tipo de mensagem de ódio num festival nos EUA é inaceitável; eles não deveriam ter o direito de continuar se apresentando aqui”, argumentou Sharon em resumo, conclamando colegas da indústria a se juntarem a ela para barrar o Kneecap.
Por que a comunidade judaica viu perigo no protesto?
Para grande parte da comunidade judaica mundial, o episódio do Kneecap no Coachella foi mais do que uma simples afronta a Israel foi um lembrete alarmante de como o ódio pode ganhar roupagem de ativismo e se infiltrar em espaços culturais populares. As frases projetadas e palavras de ordem bradadas pela banda tocaram em feridas abertas: menos de seis meses antes, em outubro de 2023, o festival de música Nova em Israel havia sido palco de um massacre brutal, quando terroristas do Hamas assassinaram centenas de jovens que celebravam ao ar livre. Foi o maior massacre em um evento musical na história recente
Parecia que, em vez de solidariedade às vítimas do Nova, havia quem estivesse normalizando ou glorificando a narrativa dos agressores!
Líderes judeus e organizações de defesa rapidamente se manifestaram. A Creative Community for Peace, uma ONG formada por profissionais da indústria do entretenimento que combate o antissemitismo, divulgou um comunicado duro. “Festivais como o Coachella existem para unir as pessoas em celebração à música e à vida”, escreveu Ari Ingel, diretor da entidade. “Em vez disso, permitiram que o festival degringolasse em um fórum de ódio dando palco a uma banda que elogiou um grupo terrorista responsável pelo maior massacre da história da música” .
Cultura pop, liberdade de expressão e o limite do tolerável
O incidente levanta uma questão crucial: qual o papel e a responsabilidade da cultura pop em tempos de polarização política e recrudescimento de discursos de ódio? Festivais de música como o Coachella há muito se vendem como “espaços de liberdade”, onde artistas podem se expressar livremente e até desafiar o status quo. Protestos e manifestações políticas em shows não são novidade de discursos contra guerras às bandeiras de orgulho LGBTQIA+, a arte sempre dialogou com ativismo.
Como continuar sendo palco de contestação e reflexão sem ser cúmplice na propagação de ódio?
No Coachella 2025, infelizmente, vimos um exemplo do segundo caso. A retórica agressiva do Kneecap não “libertou” ninguém; em vez disso, feriu e alarmou uma comunidade já vulnerável, atiçou animosidades e transformou um momento de arte em um ato de propaganda radical.
No balanço final, o legado desse episódio serve de alerta. Quando o ódio é banalizado, as consequências podem ser perigosas para todos. Como sintetizou Ari Ingel, do Creative Community for Peace, a música deve unir, não incitar guerra .
A liberdade de expressão é um valor fundamental, mas, como se viu naquele dia 18 de abril, até mesmo ela precisa de responsabilidade para não se converter em arma contra a própria liberdade e a segurança de outrem.
*Mila Schneider Lavelle é jornalista com formação também em teologia e especialista em Marketing, tendo atuado como Head Manager de grandes projetos internacionais e nacionais. Reconhecida por sua análise crítica e estilo incisivo, é também influenciadora digital, com ênfase em geopolítica e temas internacionais, sobretudo ligados ao Oriente Médio.
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Eraldo 23/04/2025
Esse artistas lavradores vivem numa bolha, totalmente fora da realidade. E enchem o cérebro dos jovens com m&rd@ e suas músicas ruins e doutrinação ideológica.
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