Uma investigação internacional revelou que a Venezuela tem utilizado o nome do Brasil como fachada para camuflar exportações de petróleo destinadas à China, em uma tentativa de driblar sanções impostas pelos Estados Unidos. A manobra, denunciada pela agência Reuters e repercutida pela revista Veja, envolve práticas fraudulentas como falsificação de documentos de origem e uso de sinais de localização adulterados por navios-tanque.
O esquema se apoia em uma técnica conhecida como “spoofing”, em que embarcações venezuelanas desligam seus transponders ou transmitem sinais falsos, simulando estar em portos brasileiros — apesar de nunca terem se aproximado da costa do país.
Segundo empresas de rastreamento marítimo e fontes do setor de energia, mais de US$ 1 bilhão em petróleo venezuelano foi rotulado como se fosse “mistura de betume” brasileira, um produto praticamente inexistente na pauta de exportação do Brasil. A Petrobras já negou qualquer envolvimento ou origem nacional dessas cargas, destacando que o petróleo exportado para a China é, majoritariamente, leve e oriundo do pré-sal.
Ainda assim, entre julho de 2024 e março de 2025, as alfândegas chinesas registraram 2,7 milhões de toneladas de “mistura de betume do Brasil” — equivalente a 67 mil barris por dia — um comércio que não aparece nos dados alfandegários brasileiros.
Como opera o esquema
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Navios-tanque venezuelanos, como o Karina (bandeira da Libéria), carregam petróleo pesado do tipo Merey e falsificam o sinal de localização, alegando estar em águas brasileiras.
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A carga é acompanhada por documentos fraudulentos e certificados de origem brasileira.
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Ao chegar na China, o petróleo entra como produto “não-cru”, o que evita as exigências burocráticas e as cotas de importação de petróleo bruto, além de escapar das inspeções habituais feitas na Malásia.
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A operação é coordenada por empresas intermediárias como a Hangzhou Energy, que desde 2021 embarca petróleo da estatal venezuelana PDVSA e aparece em documentos internos como articuladora dessas remessas disfarçadas com origem brasileira.
Apesar da gravidade da fraude e do uso indevido do nome comercial do Brasil, nenhuma autoridade brasileira — como a Receita Federal, o Itamaraty ou o governo federal — se manifestou oficialmente até o momento, tampouco foi anunciada qualquer investigação sobre o caso.
As revelações elevam o risco de constrangimento diplomático e podem trazer consequências comerciais para o Brasil, cuja reputação está sendo usada para encobrir a exportação de petróleo de um país sob duras sanções internacionais. Desde 2019, os Estados Unidos impõem restrições severas à venda de petróleo venezuelano, em resposta a denúncias de autoritarismo e violações de direitos humanos por parte do regime de Nicolás Maduro.
A China, maior importadora mundial de petróleo, continua sendo o principal destino do óleo venezuelano. Só em 2024, o país recebeu uma média de 351 mil barris por dia, volume que subiu para 463 mil bpd nos primeiros meses de 2025 — com mais de 90% dessas cargas disfarçadas como originárias de países como Malásia e Brasil.