O futuro da moda está sendo moldado por pixels – e com rostos que já conhecemos. A H&M iniciou uma movimentação ousada: transformar modelos reais em versões digitais hiperrealistas, que podem estrelar campanhas publicitárias sem sair do lugar. Usando tecnologia avançada, a empresa está escaneando modelos de forma minuciosa, capturando traços físicos, expressões e até o jeito de se mover. O objetivo? Criar avatares tão autênticos que até o namorado de uma delas não soube distinguir a original da cópia.
O projeto envolve a digitalização de 30 modelos ainda este ano, e promete dar a elas autonomia sobre suas réplicas, com direito a contratos e remunerações semelhantes às de trabalhos convencionais. Parece moderno, justo e conveniente.
Mas o que parece inovação pode trazer efeitos colaterais sérios para os bastidores da moda.
Com avatares substituindo presenças físicas, quem perde espaço são os profissionais que dão vida a uma produção: maquiadores, figurinistas, fotógrafos, iluminadores, produtores. Se o ensaio acontece todo dentro de um computador, o time criativo fica de fora. E o setor, que já enfrenta desafios com a automação, pode se tornar ainda mais excludente.
Outro ponto sensível é o impacto sobre novos talentos. Se um avatar pode ser escalado para múltiplas campanhas simultaneamente, qual o espaço que sobra para quem está começando? O mercado pode acabar centralizado em poucos rostos – ou clones deles.
E ainda há a questão estética. Será que esses modelos digitais vão seguir uma cartilha de perfeição irreal? Se tudo pode ser ajustado digitalmente, o que acontece com a autenticidade, com as diferenças, com a moda feita de diversidade?
As autoridades começam a reagir. Nova York, por exemplo, aprovou uma legislação que entra em vigor em junho, exigindo consentimento formal antes que essas réplicas sejam usadas comercialmente. Um passo necessário num cenário que avança rápido demais.
A tecnologia vai fazer parte do futuro da moda – isso é inegável. A discussão, no entanto, precisa ir além do brilho das novidades. Estamos diante de uma revolução silenciosa, que pode redefinir valores e relações de trabalho. Cabe a nós, como consumidores, profissionais e comunicadores, questionar: qual moda queremos sustentar? Uma que celebra o humano ou que se contenta com suas sombras digitais?
A resposta não está nos algoritmos – está na consciência.