Nos últimos anos, o Supremo Tribunal Federal tem assumido protagonismo em investigações de grande porte, com um número crescente de inquéritos concentrados nas mãos de ministros específicos. À frente desse movimento está Alexandre de Moraes, relator de uma série de apurações interligadas que se originaram no controverso inquérito das fake news, iniciado em 2019.
Desde então, Moraes se consolidou como a principal figura nos casos envolvendo atos antidemocráticos, milícias digitais e o ex-presidente Jair Bolsonaro.
A ascensão de Moraes como relator de processos de grande escala coincidiu com o declínio da Operação Lava Jato, cujos desdobramentos foram desidratados por decisões da própria corte.
Paralelamente, outros ministros também passaram a acumular inquéritos relevantes, o que tem gerado discussões sobre a centralização de poder e o alcance da interpretação do STF sobre conexões entre casos.
Cristiano Zanin, por exemplo, ganhou notoriedade ao assumir a operação Sisamnes, que investiga a morte do advogado Roberto Zampieri e revelou uma rede complexa de corrupção e tráfico de influência envolvendo tribunais estaduais e o Superior Tribunal de Justiça.
Os dados extraídos do celular da vítima abriram caminhos para outras investigações, inclusive sobre um grupo extremista com atuação clandestina.
Kassio Nunes Marques também passou a supervisionar a operação Overclean, que apura um esquema de desvios milionários no Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), com possíveis ramificações políticas no União Brasil.
A relatoria do caso chegou a ser contestada pela Polícia Federal, que preferia Flávio Dino, atual responsável por uma série de investigações sobre emendas parlamentares e autor de decisões que abriram novos inquéritos sobre o uso desses recursos públicos.
Dino, por sua vez, lidera um conjunto robusto de apurações, incluindo a EmendaFest, sobre corrupção na liberação de verbas para saúde, e a investigação que resultou na denúncia contra Juscelino Filho, ex-ministro e deputado do União Brasil.
As decisões do ministro têm levado estados e municípios a prestar contas sobre repasses via emendas Pix, sob risco de responsabilização.
Especialistas alertam para a prática do Supremo de aplicar uma interpretação mais ampla na conexão entre casos, como explica o professor Marcelo Cavali, da FGV-SP. Ele observa que o tribunal tem agido com mais liberdade do que juízes de primeira instância, justamente por não haver instância superior que possa anular seus atos.
Moraes, segundo ele, representa um ponto fora da curva, com decisões que abrangem inclusive fatos ainda não ocorridos à época da instauração do inquérito.
A concentração de investigações de grande impacto em poucos gabinetes não só redefine o papel do STF como instância revisora, mas também levanta questionamentos sobre os limites de atuação de seus ministros no cenário político e jurídico nacional.